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O momento

O cheiro da chuva entra por seu corpo. Ela sabia que uma hora ou outra as gotas chegariam como um dilúvio. Lê mais uma vez a mensagem recebida. Quanto mais lê, menos faz parte dela e mais de sua história. Ela respira compassadamente até a vela se apagar por completo. Ela está pronta para enfrentar sua versão masculina. Abre a porta e vai de encontro a ele. Talvez fosse mais fácil se o espírito vingativo dele não fosse tão aguçado. Ele a encara por um breve instante, longo o bastante para deixá-la tonta de tanta excitação. Ele não sabe, mas ela espera por esse momento a vida inteira. E lá estavam eles, se mostrando cúmplices de seus erros mais comprometedores. Neste momento não houve palavras, eles eram espelhos refletidos um do outro. Ele, sempre deixando indagação. Ela, se forçando a não indagar. Mas dessa vez não teve escapatória. Foi então que ela soube: sua alma estava entregue a um vampiro.
Paula Cristina.

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Ao léu

A noite escura, os passos largos, o banco da praça escondido pelas sombras, a cerveja numa mão, o cigarro na outra. Soltou o cabelo, a medalinha na mão. Riu de si e de seus meros surtos, aqueles tão antigos que nem se lembra quando foi a última vez que os deixou se apoderarem. Fechou os olhos e recitou, utilizando toda a energia restante, aquele poema tão antigo quanto sempre soubera. Enquanto recitava bebericava da garrafa de cerveja, sentindo o líquido escorrer pela garganta, leve, solto, ondulante. Cansou do cigarro, mas deixou-o ali, queimando, apenas para sentir o cheiro da fumaça dançando sobre seu corpo. Lembrou daquela canção que cantava quando estava feliz, riu-se. Onde já se viu: triste, lembrar de momentos felizes. Não fazia um pingo de sentido, mas mais uma vez, nunca fez sentido, nem mesmo para si. Assistiu a morte chegando devagar e impossibilitando um gato na rua. Não moveu um músculo, não se importava, pelo menos não hoje. Fuzilou a noite com um olhar avassalador. Quem

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Como não acreditar em clichês, quando eu sou fruto dele? Filha do amor, isso é tudo que eu posso me tornar. Não adianta tentar esconder ou fugir da verdade nefasta que sou. Quanto mais fujo do amor, mais eu me perco de mim mesma. É curioso como algumas pessoas entendem o amor como algo sério, duro e difícil. E talvez seja se você busca esse amor como uma forma de garantia de sua felicidade. A questão é que o amor não é garantia de felicidade. O amor é um ato que nasce do servir. Mas não o servir capitalista de fazer algo para receber em troca. Este ato de servir deve ser puro, sem segundas intenções. Você intui a importância de uma ação e age servindo, entregando seu melhor, porque é necessário. Muitas vezes o amor é confundido com sentimento, porque junto da intuição e da ação vem uma paz e uma alegria, que misturadas, trazem um sentimento inexplicável que para cada pessoa terá uma cor, um cheiro, uma sensação e uma lembrança diferentes, que combinados trazem emoções e sentimentos à t